Leitura na Cozinha: O Terceiro Prato (Dan Barber)

Daqueles livros que reviram por dentro, fazem repensar a vida e mudam as lentes com que enxergamos as coisas.


Minha história com Dan Barber começou ano passado, quando assisti o episódio 2 da 1ª temporada de Chef’s Table. Ali tive meu primeiro contato com o chef e o movimento farm-to-table, que defende a sazonalidade e o aproveitamento na cozinha de restaurantes (e das casas também, por que não?) do que os agricultores locais têm a oferecer em cada momento e não as vontades das pessoas. Preciso dizer que me encantei?

Alguns meses depois, descobri este livro “O Terceiro Prato” – obra do mesmo Dan Barber, que visa expor uma série de pensamentos, histórias e experiências sobre o futuro da comida. Pedi o livro de aniversário e por ter agora acabado de lê-lo, sinto-me na obrigação de compartilhar minhas impressões e aprendizados.

A ideia do livro surgiu em um momento em que Dan foi desafiado por uma revista a pensar no que se comeria daqui a 35 anos. A reflexão dele evoluiu em três pratos: o 1º consistia em um bife de 200g de boi alimentado com milho acompanhado de mini cenouras ao vapor (combinação típica do século XX); já o  2º consistia em um bife de 200g  de boi de pasto acompanhado de cenouras de variedade resgatada cultivadas em solo orgânico (apesar de muito parecido com o 1º, apresenta algumas mudanças e representa bem o momento atual – século XXI); por fim, o 3º consistia em um bife de cenoura dominando o prato com molho à base de lascas de carne de segunda assada (esse sim representava pra ele o que comeríamos daqui a 35 anos). Neste momento, ele percebeu que o que temos em mente como pratos do futuro pode mudar completamente a nossa cultura (porque o ato de comer é parte expressiva dela) e, por consequência, as paisagens (afinal, o que comemos está nelas – acima ou abaixo do solo).

A experiência de ler o livro foi para mim reveladora, impactante e inspiradora. Reveladora porque eu nunca tinha pensado que por trás dos ingredientes que usamos todos os dias existe uma rede de relacionamentos que os viabiliza – não só de pessoas, mas de outros vegetais e grãos cultivados em conjunto (no caso de plantações não monocultoras), sociedades de micro organismos em parceria no solo e uma diversidade sem fim de animais acima do solo. Impactante porque não tinha me atentado ao fato de que o sistema alimentar atual é instável e falido, uma vez que não se preocupa com a saúde do solo ao priorizar monoculturas altamente produtivas (que consomem todos os seus nutrientes sem reposição) – principalmente para sustentar o consumo desenfreado de carne já que os animais são alimentados por grãos em sua maioria; além de contribuir com a redução de áreas de floresta e níveis de lençóis freáticos, deteriorando as paisagens naturais. Inspiradora por descobrir que está acontecendo um movimento de mudança na forma como as coisas são feitas por meio do modelo “do campo-à-mesa”, que visa aumentar o sabor e os nutrientes dos alimentos, adequando os menus às estações, regiões, características e produções dos agricultores locais.

Foi absurdamente animador descobrir a “nova cozinha” que procura além de valorizar a procedência dos ingredientes por si só, refletir o que as paisagens como um todo oferecem, incentivando a composição de sistemas agrícolas completos e sustentáveis tanto acima quando abaixo da terra. É fato que os passos ainda são pequenos, mas existem e estão se espalhando em diversas direções, multiplicando-se e sendo potencializados em diferentes lugares.

Se recomendo o livro? MUITO! Se pudesse, comprava um pra cada pessoa que conheço, porque é daqueles livros que enriquecem e transformam muitas coisas do lado de dentro!

Por fim, deixo aqui meu muito obrigada ao Dan Barber por me fazer enxergar que tudo que como não pode ser visto isoladamente. Cada “ingrediente” é parte de um todo complexo e absurdamente integrado, cheio de relacionamentos que podem se nutrir ou não, se ajudar ou não, se sustentar ou não. Já não consigo pensar em um alimento sem pensar no solo, na terra, no mar e na semente e em tudo que aprendi em cada uma dessas seções no livro.

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3 comentários Adicione o seu

  1. farm to table é vida! é engajamento! é estilo de vida! é respeito ao próximo e contato direto com a natureza. Boa dica de leitura!

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    1. Exatamente 🙂 comecei a aprender isso faz pouco tempo, mas aos poucos dou passos pra me transformar e abraçar completamente essa ideia – na minha cabeça ela já me transformou.. agora é passar isso pro dia a dia, como você falou, transformar em estilo de vida 🙂 de tiver mais dicas sobre como implementar isso no dia a dia, por favor fala ❤

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